quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Globalização

Há muito se fala em globalização, conceito que, inevitavelmente, inclui a padronização da cultura e dos seres humanos. Quanto mais globalizado o individuo, mais próximo de uma cultura genérica ele se encontra; e, obviamente, mais distante de sua própria cultura. Quanto maior essa referida cultura genérica (geral), mais abrangente o poder de sua influência. Em que recanto do planeta traços dessa cultura geral ainda não chegou? Neste século nascente não existe recôndito onde ela não exerça algum nível de influência - por menor que seja, embora nunca insignificante. Como se nos apresenta essa cultura geral? Através da economia, do comportamento, da arte, da educação, ciência e tecnologia, midias - principalmente as eletrônicas como a internet e a televisão. Como interagimos com ela? Através da adoção de seus princípios: o principal entre eles é o conceito de inclusão. Todos queremos fazer parte da globalização, pois, numa primeira acepção, ficar de fora significa permanecer num estado primitivo da civilização; renegar o novo é admitir seu misoneísmo, enquanto globalizar-se é estar permanentemente sintonizado com as novidades. Em novas acepções, passamos a compreender que a globalização é um processo irreversível de mudanças significativas que envolve o mundo e tudo o que este compreende, incluindo a natureza e as culturas primitivas. Definitivamente, avançamos a passos largos rumo à padronização social e genética. É inevitável que as culturas - hoje separadas pelas suas diferenças - venham a integrar-se no sentido de originar talvez não um conjunto de valores híbridos, mas, principalmente, um conjunto novo de regras e valores que regerão todo o comportamento humano a partir dessa grande fusão: essa fusão está em processo desde os primórdios da civilização; na contemporaneidade assistimos a aceleração desse processo. Nunca antes as transformações foram tão vertiginosas, nem tão pacíficas, embora o último século tenha sido um dos mais sangrentos da história. Mas esse fato se deu basicamente porque a questão da identidade num mundo que se sintetiza tornou-se fator crucial. A luta da identidade particular neste processo expressa a recusa do ego em aceitar a sujeição ao coletivo. O que o ego desconhece é o fato de que essa sujeição não será absoluta. Trata-se aqui de uma troca justa onde cede-se uma parte de si para receber um benefício (nada que já não tenhamos feito antes: veja "O Contrato Social" de Jean Jaques Rousseau). A necessidade de determinar como e para onde deve caminhar a humanidade pautou as decisões dos setores governamentais - não podemos separar dessas decisões o medo do outro, do estrangeiro, da cultura estranha à sua.
Sabemos que o medo e a ambição incitaram o desejo de conquistar o mundo. Mesmo sabendo que a globalização está em processo desde o início da civilização - diría até que a própria civilização é esse processo -, as diferenças entre os povos ainda é gritante e causa dos muitos males que sofremos. É por causa dessa diferença - que origina o conceito de superioridade - que muitos repudiam violentamente a raça e cultura do outro. É esse fator que garante a sobrevivência da espécie num habitat hostil, mesmo que a ideologia e a guerra - em todas as épocas - contrariem, às vezes, essa constatação. A globalização e sua consequente padronização dos costumes poderá, finalmente, minimizar esse tipo de violência. Tendo essa mudança na relação entre os seres-humanos como um fator desejável, podemos inferir que a globalização é benéfica. Se esta é fundamental para a redução das diferenças e consequente aceitação do outro só nos resta desejar que ela se consolide. Afinal, quem não deseja viver em paz com seu conterrâneo, com o indivíduo de outra raça, com aquele que habita os rincões do mundo? Quem não deseja a paz? Sómente aquele que obtém lucro com a guerra; só aquele que possui índole maléfica e obtém prazer em causar o mal; só aquele que se encontra possuído pela noção falsa de superioridade...
Há quem defenda a não globalização, pois vê nesta o fim daquelas diferenças que enriquecem a cultura humana. Vê nesses traços individuais a razão sine qua non da existência humana. Quem não se admira das artes e invenções criadas tanto pelo ocidente quanto pelo oriente; seus diferentes pontos de vista a respeito de qualquer assunto? Digo, de antemão, que nada disso se perderá com a consolidação da globalização. Os individuos, por mais que vivam sujeitos a um mesmo padrão cultural, não deixarão de viver em pontos longíquos do planeta e mesmo que venham a falar uma única língua, não deixarão de apresentar sotaques, por mais sutís que sejam. E produzirão arte tão distinta uma das outras quanto hoje o fazem. Um individuo só é plenamente identico à outro na ficção - e mesmo nela, a diferença é o tema principal da obra. Na realidade, mesmo com interferência genética, nós somos e continuaremos a ser diferentes uns dos outros. Pelo menos é o que supunho, mesmo tendo em vista a atual condição da ciência genética e cibernética. Presumo que num futuro relativamente distante, o ser-humano que habitará a terra será um indivíduo privilegiado tendo a seu serviço toda uma gama de robôs. Todo serviço não honroso e subalterno, porém estritamente necessário, será efetuado por essas criaturas de metal capacitadas por micros computadores em lugar de cérebros, e não por pessoas consideradas inferiores por qualquer traço que as diferencie.
É natural que aceitemos o fato de que a humanidade será reduzida consideravelmente em comparação à demografia atual. A não ser que seja designada - o mais provável - para a exploração e povoamento de novos planetas: a exemplo de um passado remoto quando as metrópoles exploravam suas colônias na africa e no novo mundo. Considerando essa possibilidade é de se supor que o planeta será, em algum momento desse processo, preservado - ou o que restar dele. É claro que as diferenças sociais permanecerão, mas, tendo em vista uma padronização também na qualidade de vida, essas diferenças poderão ser atenuadas: o que minimizará o sentimento de inferioridade dos menos afortunados.
Imaginemos um mundo onde só existe uma língua; um mundo onde todos podem se comunicar beneficiados por esse fator. Um mundo sem fronteiras, onde qualquer um detém o direito e o privilégio de ir e vir justamente por serem todos de uma mesma nacionalidade. Um mundo onde só existe um governo (melhor supor, neste caso, a aplicação do conceito de adminstração, mais apropriado à um mundo novo) e, portanto, nenhum outro para fazer oposição. Um mundo onde só existe uma moeda, onde a inexistência de uma superioridade econômica sugere também a inexistência dos conflitos desencadeados em caso contrário. Imaginemos, através de séculos de cruzamentos, a homogeneização das raças. Com isso obteremos o fim dos preconceitos e dos violentos conflitos que tanto caracterizam o confronto das raças em nosso tempo. Só uma raça preconceituosa e presunçosa não toleraria a possibilidade de perecer em favor de uma raça de características universais. Se a diferença entre as raças e entre os indivíduos de uma mesma raça é fator de inúmeras vantagens é também fator determinante de inúmeras desvantagens (se hoje o mestiço é visto como um individuo oscilando entre duas culturas, num contexto onde ele torna-se a regra e não a exceção, essa situação desconfortável simplesmente desaparece). Muito dos benefícios produzidos por estas diferenças não desaparecerão numa cultura socialmente padronizada: a capacidade do ser-humano em criar permanecerá inata. O acesso à cultura seria determinado pela capacidade individual e não totalmente, como hoje, pelo privilégio da raça e condição sócio-econômica.
Há muito o que refletir sobre esse assunto. Não sou autoridade, apenas um curioso que pensa, às vezes, na possibilidade nada remota de uma padronização da cultura e do elemento humano. Gostaria que os visitantes desse blog postassem sua opinião a respeito desse assunto para que possamos desenvolvê-lo a um nível de satisfação. Nada é mais atual e urgente que esse assunto, pois esse provável mundo não está assim tão longe de sua consolidação. Estou ciente de que nenhuma ficção literária ou cinematográfica à respeito trata com seriedade as provaveis consequências dessa consolidação. O processo dessa consolidação pode, sim, originar conflitos e confrontos violentos num futuro breve, pois sabemos como algumas nações contemporâneas ainda insistem em manter-se fora desse contexto universal que vêm sendo buscado desde tempos imemoriais; mal sabem eles que já se encontram dentro do processo e que apenas o ego de algum tirano narcisista teima em fazer crer que a não integração é que é a opção correta.
Sujeito este texto a inserção, a qualquer momento que julgar necessário, de novas considerações sobre o assunto, inclusive à mudança de alguma já postada, caso compreenda que a mesma requer novo tratamento. As opiniões que se pronunciarem serão postadas como comentários à parte do texto, seguindo as determinações do blogger.

Gilberto Lins

3 comentários:

  1. "Imaginemos um mundo onde só existe uma língua; um mundo onde todos podem se comunicar beneficiados por esse fator."

    Me fez lembrar "Imagine" (eu tinha que falar isso alguma coisa que envolvesse Beatles, hehe).

    Enfim...

    Sinceramente minha visão com relação à globalização era aquela bem simplista e um tanto quanto unilateral de que, com seu advento, todo e qualquer tipo de características que diferenciam uma cultura da outra seria extinguido. Mas vi que faz muito sentido o que foi dito no texto:

    "Os individuos, por mais que vivam sujeitos a um mesmo padrão cultural, não deixarão de viver em pontos longíquos do planeta e mesmo que venham a falar uma única língua, não deixarão de apresentar sotaques, por mais sutís que sejam. E produzirão arte tão distinta uma das outras quanto hoje o fazem. Um individuo só é plenamente identico à outro na ficção - e mesmo nela, a diferença é o tema principal da obra."

    Logo que li esse trecho me veio à mente a imagem de um país, como por exemplo o Brasil, onde todos falam a mesma língua e de forma geral mantém hábitos parecidos, mas que, no fundo, conserva em cada região suas peculiaridades e sotaques, coisa que de uma forma ou de outra, não mudará; até mesmo pelo fato de "cada um de nós ser um universo", diferenças sempre existirão, e isso é algo saudável.

    Sinto que a globalização já é uma realidade, e fatalmente fará mais e mais parte da vida das próximas gerações. Resta saber se, de fato, conseguiremos chegar ao ponto satisfatório de conseguirmos, através dela, abolir de vez qualquer tipo de intolerância e desrespeito.

    Esperar pra ver.

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  2. Muito bom o texto, opinião muito bem colocada, parabéns.
    Embora eu acredite que esta mudança fique a cada dia mais longe, quase utópica, seria bom se todos falassemos um unico idioma, isso romperia barreiras, mas para toda mudança, há uma resistencia de igual valor, creio que a igualdade deve ser não em termo de culturas, pois se pensarmos um pouco, o brasileiro é uma mistura de raças, voltando ao ponto, creio que a igualdade deve ser tomada em termo de oportunidades, promover as pessoas a um nivel educacional melhor, pois assim a globalização será um ciclo natural, Antes de esta acontecer, temos que pensar em que tipo de pessoas irão promovê-la e que tipo de pessoas irão "sofrer" essa mudança.

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  3. Isabela e Carraro, só para estender mais o conceito de globalizção, eu considero a Mesopotâmia o ambiente onde essa experiencia teve início. A idéia contida em "Imagine" de John Lennon, é uma idéia utópica. O fato de sermos cada um de nós "um universo" impõe, naturalmente, uma barreira na igualdade absoluta. E esta idéia de todos os seres humanos sentirem e pensarem igual sobre tudo, torna a situação, de fato, indesejável. O que serão das artes e demais culturas, das diferenças de comportamento, das opiniões, se um estado desse se instala. Este estado só é desejável pelos tiranos e espero que o tempo deles já tenha passado. A padronização a que me refiro no texto está mais associado ao aspecto coletivo dessa sociedade e esse aspecto será regido pela economia: fator principal desse processo de globalização. A liberdade de criar e ser terá que ser respeitada, caso contrário só nos restará a luta como defesa contra este possível estado absolutista. A desigualdade individual (natural) entre os seres humanos não será abolida tão facilmente (a não ser que a genética realize o sonho dos ditadores nos tornando todos iguais fisicamente: tal como Hitler idealizou a população de uma Europa comandanda por ele), de modo que a intolerância e o desripeito pelo outro será uma das últimas característica em seu caráter a ser abolida. Mas, a medida que as oportunidades de estudo e trabalho forem se democratizando (este processo já é uma realidade hoje), quando o critério pela escolha dos melhores empregos for o talendo e a competência e não pela classe social a que pertence o individuo, essas intolerâncias perderão o sentido. A distância que estamos da plenitude desse conceito de globalização dificulta nossa compreensão de todos os seus aspectos, mas isso não nos impede de pensar a respeito. Só dessa forma poderemos vislumbrar sua silhueta.

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